2.05.2011

Poética da angústia na escrita hodierna - um ensaio

Declaro-me escritor e que se foda. Sim, porque a minha vida dava um microconto. Nós, os escritores, como cada vez nos resumimos mais, cada vez nos sofisticamos mais, tem de ser. Os melhores escritores, mesmo sendo clássicos e abrutalhados, e até poetas mariconços de todas as épocas, percebemos isso muito bem e contribuímos com alguma coisinha. Vamos à questão. É Janeiro, noite, neve, frio, a alma invernal gelada como uma arca ligada no máximo – e parece que está tudo dito. Pois não está. Não exageremos na redução e acrescentemos um relógio branco e redondo de cozinha com orla vermelha como um sol nocturno e algarismos árabes, parado nas onze e meia da noite e do dia, um relógio portanto sem tiquetaque, silencioso e triste como um prostíbulo de província sem clientes, sem aquecimento e sem sabão na noite escura, um relógio “quartz”, para que saibam, porque adiante há-de aparecer um mestiço indonésio de apelido Schwartz falando um português comovente e um inglês sofrido. Não poupemos excessivamente nas personagens.

Sem comentários:

contacto: