3.17.2011

Tchernóbil e Fukushima-1

Um amigo, sabendo que eu estava em Moscovo em 1986, convida-me por mail a fazer um paralelo entre Tchernóbil e Fukushima. Primeiro, o facto de viver em Moscovo na altura não me dá qualquer autoridade nem conhecimento para falar disso, pelo contrário: na Moscovo da URSS, apesar da perestroika, fomos menos esclarecidos sobre Tchérnobil do que no Ocidente. Soube-se depois que o próprio Gorbatchov não foi informado de imediato da eclosão da catástrofe, tais eram os mecanismos renitentes da controladíssima informação soviética. Nada disso aconteceu no Japão, apesar de no primeiro dia do acidente o tom ser de optimismo, de segurança, de desvalorização da gravidade, o que até se compreende para não criar pânico por causa de mais aquela desgraça dentro da desgraça. Agora, sobre Fukushima, assistimos como que a um live informativo permanente entre as autoridades e a população, com a participação, até, de peritos estrangeiros. É claro que não nos é dito tudo, a informação sai a conta gotas, incompleta, e começou já a haver contradições entre a informação japonesa e a americana. Quanto ao acidente, há mais semelhanças do que diferenças. Aliás, a diferença é de um grau: numa escala de 0 a 7, Tch. foi de grau 7 e Fuk. de grau 6. Só que em Tch. o incêndio foi de grandes proporções e levou os fumos altamente radioactivos até muito longe. Lembro-me de que na Rússia apareceram de imediato os vigaristas, as falsas colectas, um aproveitamento desumano e vergonhoso da catástrofe. São assim os russos? Alguns, é claro. Por outro lado, quando foi preciso colocar o “sarcófago” de betão sobre os reactores em fusão, foram milhares de voluntários que o fizeram, sabendo que corriam risco de vida (aliás, a maioria dos mortos, a curto e médio prazo, foi a destes coveiros salvadores). Conheci dois desses heróis, moscovitas. É assim a Rússia, maximalista: o bom e o abjecto, o herói e o verme. No Japão, pelo que vejo e leio, parece haver uma cultura colectivista muito profunda que tudo equilibra. Outra triste similitude: tanto em Tch. como em Fuk., a causa da catástrofe foi a vetustez das centrais, a não actualização das medidas de segurança, o facilitismo (em Fukushima-2 não aconteceu nada de grave, nas centrais nucleares francesas não acontece nada de grave). Condenar acefalamente o nuclear sem procurar as causas dos acidentes não os resolve nem os evita.

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