12.20.2010

Ode aos editores portugueses

Novas traduções dos clássicos russos: sinal de progresso cultural.
Antes de ir ao assunto, tenho de esclarecer que Nina Guerra (a principal tradutora da nossa equipa de tradução) e eu próprio sempre nos congratulámos com o aparecimento de novas traduções (directamente do russo) dos livros que eventualmente tenhamos traduzido. E que trabalhamos há mais de vinte anos no nosso projecto de tradução para seis editoras distintas – 70 títulos traduzidos – mas não estamos ao serviço de nenhuma delas. Só nos interessa quem melhor edite o nosso trabalho, e até agora não temos razão de queixa. O nosso principal “concorrente” é o colega António Pescada, que está a traduzir livros que já traduzimos de Dostoiévski e Tolstói. Por entrevistas dele ao Jornal de Letras e a outros órgãos, ressalta que o seu método de trabalho é sério, que pretende “melhorar o que está feito”, que cada tradutor escreve um novo Guerra e Paz, por exemplo (e é verdade), e tem dito também nos jornais que se serve para isso da ajuda de traduções de terceiras línguas (francês e inglês) e de outras traduções já existentes em português. Não é o nosso método de trabalho, uma vez que traduzimos puramente do russo (daí os russismos, de que não nos desculpamos, se forem compreensíveis para os portugueses, porque dão cor local) e que todas as nossas fontes de pesquisa são russas. Mas não nos opomos ao método do Pescada, o que interessa é o produto final.
Esta informação leva-me ao verdadeiro assunto: o nosso miserabilismo cultural assumido, os nossos queixumes, a nossa ladainha de que “lá fora” é que é bom, de que estamos 50 anos atrasados (onde foi a vox populi buscar estes 50 anos? E aquele “há 30 anos que não via uma tempestade assim?”), pois bem, no sector da edição – e atrevo-me a dizer que os editores de livros são dos nossos melhores agentes culturais – o atraso português começa a ser colmatado com êxito. Se nos orgulhamos de há vinte anos termos sido pioneiros na tradução maciça e planeada dos autores russos directamente da sua língua, hoje ainda nos orgulhamos mais, pelo facto de isso se ter tornado uma prática corrente na edição e de, agora, essas traduções já serem duplicadas e triplicadas, dando possibilidade à discussão das traduções, ao debate, à escolha, ao aprofundamento das obras e dos autores traduzidos; e, quiçá, ao surgimento de uma crítica da tradução, que ainda não existe (para isso é necessário que tal crítica se baseie na obra original, na língua original).

Sem comentários:

contacto: