4.14.2011

Você, nhurro, sabe o que é a poesia, tem alguma formação nessa matéria?

Ler a prosa insípida que cito abaixo é como beber cerveja sem álcool na esplanada triste ou um copo de água chilra no banco do jardim.
"Sete e meia: também a praça tem as suas horas mortas. Alguns trocam a esplanada pelos bancos do jardim – aí se sentam ao frio, graves como sentinelas, não se sabe o que vigiam. Terão chegado mais jovens à solidão derradeira? Ou são apenas o espelho da tristeza de quem passa e se interroga? Os do costume, entretanto, até bebiam mais uma, catam dos bolsos moedas, pedacinhos de cotão. Mas está na hora, senhores, que o dia pesa no corpo e o rapaz que serve às mesas já pôs o lixo na rua. Meus amigos, faz-se escuro, adeus, adeus."
Já o mesmo não se pode dizer quando o génio do poeta transfigura a prosa chilra em água divina:

Sete e meia: também a praça
tem as suas horas mortas.
Alguns trocam a esplanada

pelos bancos do jardim –
aí se sentam ao frio, graves
como sentinelas, não se sabe

o que vigiam. Terão chegado
mais jovens à solidão derradeira?
Ou são apenas o espelho

da tristeza de quem passa
e se interroga? Os do costume,
entretanto, até bebiam

mais uma, catam dos bolsos
moedas, pedacinhos de cotão.
Mas está na hora, senhores,

que o dia pesa no corpo
e o rapaz que serve às mesas
já pôs o lixo na rua. Meus amigos,

faz-se escuro, adeus, adeus.

Rui Pires Cabral
(n. 1967)
Oráculos de Cabeceira
(Averno, 2009)

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